17/06/2014

Você cola na prova?

Essa semana pensei muito a respeito desse assunto. Na aula de Psicologia Construtivista o professor estava explicando sobre Moralidade Heterônoma e Moralidade Autônoma e logo associei o tema com a cola nas provas.
Eu sou professora da rede pública e vejo em algumas atividades que os alunos da 8ª série me entregam a dificuldade deles com a escrita e compreensão de textos. Mas o que isso tem a ver com a cola? Bem, meu raciocínio segue a seguinte linha:

Sou estudante, tenho dificuldades, não entrego as atividades, passo a aula toda usando o celular escondido do professor, mas o Governo disse que irei passar de ano mesmo assim e assim vou passando. Quando finalmente me formo no Ensino Médio procuro por uma universidade privada para concluir meus estudos, já que na universidade pública as chances de ingresso são mínimas, uma vez que mal sei escrever. Para passar no vestibular apenas faço uns X nas questões, pago o boleto de matrícula e pronto! Não tem problema errar 80% da prova, o importante é pagar a matricula e as mensalidades. Lá na "facul" eu vou aos trancos e barrancos, a galera é firmeza e coloca meu nome nos trabalhos mesmo sem eu ter feito nada, não estudo para as provas e nunca leio os textos que os professores indicam, esses textos tem muito blá blá blá que não vou usar nunca na minha vida, não vou perder tempo com eles. Nas provas uso meu celular escondido para colar, jogo a borracha no colo da minha colega e peço em desespero que ela passe as alternativas que assinalou e mesmo com algumas DP's eu consigo me formar. Minhas dificuldades básicas de português e matemática não foram sanadas na faculdade, continuo escrevendo mal, tendo preguiça de estudar e sempre arrumo um "jeitinho" para conseguir as coisas.
Tudo bem né?  Afinal, quem não cola não sai da escola. Trapacear assim não é tão ruim.
Quando eu estiver lá no meu trabalho o "Word" irá me indicar as palavras que escrevi errado e pronto! Ninguém vai perceber que não sei escrever corretamente as palavras. Beleza! Estou salva!

Concorda? Provavelmente sua resposta foi "sim".
Opa! Mas e se eu te disser que me formei em Pedagogia e irei dar aulas para seu filho na escola? Sou eu que irei alfabetizar seu filho, irei tirar suas dúvidas, ensiná-lo sobre tudo o que ele me perguntar na aula, corrigir seus trabalhos, verificar seus erros de português (que provavelmente são como os meus) e ajudá-lo a criar o hábito da leitura, que eu mesma não tenho.
E agora, o você pensa a respeito? Talvez algora você esteja pensando: "Quem faz faculdade para ser professor não pode ser assim", mas vou te dizer, o curso está cheio de pessoas assim.
E digo mais. Essas pessoas irão se formar, irão ser contratadas pelo Estado para dar aulas para seu filho, irão "alfabetizar" seu filho, que com um professor despreparado irá ter dificuldades, irá escrever errado, não será corrigido corretamente, não será estimulado a estudar corretamente, não será estimulado a ser um leitor, irá passar de ano sem reprovar (porque o Governo não quer que ele reprove, mesmo sem saber nada) , irá entrar para a faculdade, passará por tudo o que falei mais acima e o círculo vicioso da educação precária no país estará fechado, girando e girando sem parar.
E se eu me formasse engenheira e você me contratasse para fazer a sua casa e ela caísse em cima da sua família por estar mal estruturada e calculada?
É sobre isso que penso a respeito da cola nas avaliações. Ela vai muito além de só ser uma besteirinha para passar, uma ajudinha sem problemas. Quem cola passa de ano sim, mas será que se torna um bom profissional? Um profissional responsável?
Se fui negligente com a minha educação, como serei com a dos outros?
E foi aí que associei com o que o professor falava sobre a autonomia, da consciência de compreender as consequências de determinados atos e entender quais são os resultados disso.
Percebi que grande parte das pessoas está na fase da Moralidade Heterônoma, onde o indivíduo cumpre as regras por medo de ser punido e os que não cumprem, quando são pegos colocam a culpa nos outros e nunca neles mesmos, e nesse caso colocariam a culpa no Governo, que não lhes ofereceu uma educação de qualidade. Qualidade essa que não prezei quando fiz a minha faculdade para me formar professora e que agora estou reproduzindo essa "qualidade" nas escolas.
Olha que loucura!
Quando paro para refletir a respeito sinto medo do que vem por aí. A coisa tomou uma proporção tão absurda que a tendência é que a qualidade do ensino vá caindo cada vez mais e mais.
Não sei qual será minha reação quando abrir os jornais e ler notícias que falem que no kit escolar teremos calculadoras para que os alunos não precisem mais realizar operações apenas com a máquina chamada cérebro; que o lápis, borracha e caderno não serão mais utilizados na escola e que todos os alunos irão usar somente computadores para escrever, praticamente extinguindo a escrita a mão; que as avaliações não serão mais necessárias, já que o aluno não reprova mais de ano mesmo; que vem chegando os livros do Machado de Assis "traduzidos" para alunos sem capacidade de usar o dicionário... Oops! Essa já saiu na folha de São Paulo!


E vocês, o que pensam a respeito?

Um comentário:

  1. Só tenho uma coisa a dizer estou completamente apaixonada pelo seu blog. Você escreve totalmente o que eu penso. Quando eu vejo os meus colegas de classe colando eu tenho dois sentimentos o orgulho e a tristeza. Fico orgulhosa de saber que eu fui capaz de responder sem precisar desse método, que eu tenho capacidade e que valeu todos os meus esforços. E fico triste em pensar no futuro de cada um deles. Texto maravilhoso! Beijos!! Continue espalhando seu conhecimento você faz diferença no mundo.

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